sábado, 28 de março de 2009

5º DOMINGO de QUARESMA ANO B

1 - Contexto social com doenças físicas e morais

Vamos fazer um exercício de imaginação e viajar até a casa de Pedro, onde Jesus estava hospedado. Uma casa simples, como tantas de nossa comunidade e, de repente, na frente da casa de Pedro uma pequena multidão. Jesus estava lá. O Evangelho dizia que toda a cidade juntou-se à frente da casa de Pedro. O Evangelho dizia também que traziam os doentes e transtornados da cidade... se você fez um bom exercício de imaginação deve ter pensado como tantos de nós: diante da casa de Pedro estava uma cidade adoentada. Na próxima quarta-feira, dia 11, comemora-se o “Dia Mundial do enfermo”. Uma comemoração para pensarmos em nossos doentes e para avaliar como tratamos nossos enfermos em casa e aqui na comunidade. Jesus, como acabamos de ouvir no Evangelho, acolhia e confortava os enfermos. É um exemplo de como devemos tratar nossos doentes e idosos.

2 – Aproveitar-se da dor dos outros

A 1ª leitura e o Evangelho falavam de três tipos de sofrimento que atingem a sociedade : o sofrimento da depressão, o sofrimento da doença física e o sofrimento dos transtornos psíquicos, que na linguagem da Bíblia é traduzido com a palavra: “endemoniado”. Seja no tempo de Jesus, como em nossos dias, o homem tem dificuldade de lidar com o sofrimento, com a dor, com a doença. Hoje, por causa da mentalidade hedonista, que tende exageradamente para o prazer, para gozar a vida ao extremo, o enfermo é tratado como alguém de segunda categoria. Este é um motivo, pelo qual, tantos se tornam depressivos e, a exemplo de Jó, julgam que a felicidade é uma utopia. Quantas famílias que, por vergonha, escondem familiares com transtornos mentais dentro de suas casas, proibindo-lhes até mesmo da alegria de sair para passear na rua. A enfermidade não é fácil de enfrentar, tanto para o doente em si, como para quem cuida do enfermo e, por causa disso, tem muita gente que se aproveita do sofrimento dos outros e promete curas milagrosas para os doentes. Quantas pessoas interessadas em lucro criam empresas religiosas, que chamam de igrejas, para ganhar dinheiro às custas do sofrimento de pessoas, com promessas de curas.

3 - Evangelização como serviço e mentalidade

A esse ponto, vale a pena colocar uma pergunta: como Jesus agia? A cidade inteira tinha vindo para que ele curasse e libertasse as pessoas do mal. Jesus acolheu a todos. No dia seguinte, de madrugada, a cidade voltou com novos doentes, mas não encontrou Jesus, porque estava rezando num lugar silencioso. Quando os discípulos viram Jesus lhe disseram: “todo mundo te procura”. Em vez de voltar, Jesus levantou-se e tomou outro endereço para pregar o Evangelho. — Por que Jesus preferiu pregar o Evangelho em vez de fazer curas e milagres? Não seria bem mais fácil pregar o Evangelho curando e fazendo exorcismos? Ele ficaria famoso, poderia fazer um galpão na cidade para receber mais pessoas... mas não; preferiu pregar o Evangelho. Jesus demonstra claramente que evangelizar não é fazer curas e shows para exibir poderes divinos. Evangelizar é propor um jeito de viver. Evangelizar é colocar as pessoas no caminho de Deus. Por isso, para Jesus é muito mais importante pregar o Evangelho que curar e fazer milagres. Evangelizar é assumir o jeito divino de pensar, mas isso precisa ser acolhido no coração da pessoa pela Palavra, pela reflexão, e não pela emoção do espetáculo.

4 - Catequese para formar discípulos

São Paulo assume a mesma postura de Jesus: não escolhe fazer show de milagres e curas, mas evangelizar, mas vai de cidade em cidade pregando o Evangelho: “ai de mim se não evangelizar”, ouvimos ele dizendo na 2ª leitura. “Ai de mim se eu não pregar o Evangelho”. Faço tais considerações para que você tire suas conclusões a respeito de algumas propostas de evangelização que vemos e ouvimos por ai. Claro que diante da dor e do sofrimento as pessoas são capazes de tudo. Eu também gostaria de ter um dom especial para ajudar tantas pessoas, mas o Senhor me chama a evangelizar e é, por isso que, iluminado pelo Evangelho, procuro propor um estilo de viver capaz de conviver com a dor, se necessário, respeitar quem sofre a dor, acolher quem padece algum tipo de sofrimento. Na proposta evangelizadora de Jesus, o mais foco não está tanto no milagre, mas na atitude de serviço que estende a mão para confortar quem precisa de nós, especialmente quando estiver debilitado pela enfermidade. Amém!

Se o grão de trigo cair na terra e morrer, produzirá muito fruto. Este Evangelho narra que, durante a festa em Jerusalém, um grupo de peregrinos gregos aproximou-se de Filipe e disse que queriam ver Jesus. Quando recebeu o recado, Jesus fez esta bela comparação do grão de trigo. Foi justamente durante esta festa que ele foi condenado e morreu. O sentido é claro: quem quer, de coração aberto, aproximar-se de Jesus, vai se tornar como o grão de trigo, isto é, como qualquer semente: a exemplo de Jesus, vai morrer para produzir muitos frutos. Foi uma forma de preparar os peregrinos para o que ia acontecer no final da novena: a morte de Jesus. Preparar não só os peregrinos, mas a nós que acreditamos em Jesus. Logo após a comparação, Jesus disse a mesma coisa, sem nenhuma parábola: “Quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem faz pouca conta de sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna”. O cristianismo não é água com açúcar, mas uma religião radical, até paradoxal: só vive quem topa morrer. O caminho de Jesus é o nosso caminho. A sorte de Jesus é a nossa sorte. E não há outro jeito de chegar ao Céu nem de colaborar na construção do Reino de Deus. “Se alguém me segue, onde eu estou ele estará também... E meu Pai o honrará”. O Pai vai honrar o discípulo de Jesus com a ressurreição e fazendo-o dar muito fruto. “Sinto-me angustiado. E que direi? Pai, livra-me desta hora? Mas foi precisamente para esta hora que eu vim!” Dias depois, no Jardim das Oliveiras, tocado pela iminência das torturas e da morte, Jesus dirá: “Meu Pai, se possível, que este cálice passe de mim. Contudo, não seja feito como eu quero, mas como tu queres” (Mt 26,39). Aqui a angústia chegou ao extremo, ou melhor, chegará ao extremo na cruz, quando ele dirá: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Mt 27,46; Mc 15,34). A cruz é cruz mesmo! Ninguém escolhe o tipo de cruz que vai carregar, nem Jesus escolher. Mas atrás dela brilham raios de luz, que é a ressurreição. Nenhum cristão quer sofrer ou procura sofrimento. O que queremos é amar, e amar sempre, a Deus e ao próximo. Por isso que passamos pela cruz. Aí está resumido o mistério da vida cristã: pela dor chega à alegria, pela humilhação chega à glória, pela morte chega à ressurreição. Tudo por causa do amor assumido e vivido, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na morte e na vida. É bom lembrar que foram as palavras desses peregrinos gregos que a Igreja no Brasil tomou como lema do projeto de evangelização dos anos 2004 a 2007. O lema era: “Queremos ver Jesus, caminho, verdade e vida”. Santo Atanásio viveu no séc. IV e foi bispo de Alexandria, no Egito. Surgiu na época uma seita religiosa chamada arianismo. Os arianos diziam que Jesus não era Deus, mas apenas filho de Deus. A seita cresceu tanto, que o Papa convocou o Concílio de Nicéia, que elaborou o nosso Credo Niceno-constantinopolitano, no qual afirmamos que Jesus é “Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado não criado, consubstancial ao Pai”. Como Atanásio teve grande influência no Concílio, os arianos declararam guerra contra ele. E, para complicar, a heresia contava com o apoio do poder político, econômico e militar de Alexandria. A perseguição ia desde baixas calúnias até ameaças de morte. Cinco vezes, Dom Atanásio teve de fugir para o deserto, onde passava meses escondido. Nos seus últimos cinco anos de vida, ele passava o dia escondido dentro de um túmulo do cemitério, e à noite governava a diocese. Com Santo Atanásio aconteceu um fato curioso. Como ele foi sepultado na catedral, quando morreu, saiu do cemitério! Nós admiramos Santo Atanásio e até hoje veneramos a sua memória. Com ele aconteceu exatamente o que disse Jesus: Se o grão de trigo cair na terra e morrer, produzirá muito fruto. Campanha da fraternidade. Uma grave fonte de conflitos é a injustiça social, que tem forte incidência no Brasil e manifesta-se de diferentes formas como a concentração de renda, a não satisfação das necessidades básicas de grande parte da população e o processo cada vez mais crescente de exclusão social, cada dia com novos desdobramentos. Parcelas consideráveis da população convivem, diariamente, com a falta dos recursos básicos para uma vida digna e, até mesmo, para a própria sobrevivência. Os programas públicos de seguridade social, um ganho dos trabalhadores ao longo do tempo, são freqüentemente menosprezados pelos Estados, que tendem a deles se “desonerar” para aumentar seus cofres em vista de outros fins. Com isso, ao mesmo tempo em que são conquistados avanços econômicos e tecnológicos, acontecem recuos em relação às conquistas sociais. Escândalos de corrupção multiplicam-se. Basta citar as falências bancárias, em especial do Banco Nacional, do Banco Safra e do Banco Econômico; o Valerioduto, o caso conhecido como Sanguessuga. Tudo isso gera, na população, um perigoso descrédito diante das instituições. A injustiça social e o descaso das autoridades criam ocasiões para o surgimento de grupos, como as milícias presentes nas favelas. Por falta de oportunidades e até de amparo legal, a luta pela igualdade social segue, muitas vezes, o caminho da ilegalidade. Quem perseverar e passar pela crise do grão de trigo jogado na terra úmida, dará muitos frutos, como deu Jesus, Maria e Atanásio. Se o grão de trigo cair na terra e morrer, produzirá muito fruto.

Reflexão Dominical do Padre Gregório Olapito, SVD

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